05-2023
Segredos da fotografia de pets
Cinco especialistas dão dicas sobre técnicas para captação de imagens em um segmento que tem um mercado enorme no Brasil e só tende a crescer
Ter um bichinho de estimação em casa faz toda a diferença, ainda mais para os solitários. Mas, além de fofos e companheiros fiéis, eles movimentam um mercado bilionário, segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Produtos Pets – o que coloca o Brasil entre os primeiros no ranking dos países com mais pets. Números que servem de forte motivação para um nicho de fotografia: tanto os donos apaixonados querem retratar com qualidade seus bichinhos quanto o setor pet necessita de imagens profissionais para campanhas de rações, brinquedos e acessórios.
Se por um lado o setor é bastante promissor para quem deseja ingressar na área, por outro, fotografar esses animais não é tarefa fácil: raramente eles ficam na pose desejada, geralmente fazem bagunça e exigem muita paciência (e técnica) do fotógrafo. Ou seja: se você não curte muito pets, melhor nem tentar se inserir na especialidade. Agora, se já tem seu bicho de estimação e é apaixonado por ele, isso pode tornar menos desafiador ser um especialista da área.
Fotografe conversou com cinco feras do segmento para revelar segredos e selecionar dicas valiosas que podem ajudá-lo na hora de produzir ensaios com pets: Lionel Falcon, Johnny Duarte, Bibbo Camargo, Fernanda Cerioni e Silvia Pratta. Confira o que eles têm a ensinar e inspire-se.
Começo nos Estados Unidos
Fotógrafo argentino radicado no Brasil, Lionel Falcon é considerado um mestre do ramo nos mercados brasileiro e argentino. Ele conta que o segredo desse tipo de trabalho se resume em três pilares: sensibilidade, espontaneidade e rapidez. “É importante ter percepção do bem-estar do animal durante o ensaio, e também dominar as técnicas para conseguir deixá-lo confortável e relaxado. Isso consequentemente resultará em imagens mais naturais. E depois é preciso ser ligeiro para capturar aquilo que o bicho irá oferecer a você em troca”, explica ele.
Segundo Falcon, o segmento de fotografia de pets nasceu na década de 1990, nos Estados Unidos. Foi em Miami, atuando como repórter fotográfico de celebridades, que ele percebeu um mercado promissor e, sem contar na época com grandes referências para o trabalho, começou a desenvolver as próprias técnicas para clicar os modelos peludos. Ao se mudar para São Paulo (SP) em 2000, Falcon se transformou em um dos pioneiros em retratar mascotes no Brasil.
Outra referência no mercado brasileiro é o paulistano Johnny Duarte, que desde 1996 uniu a paixão por fotografia e animais ao negócio de clicar famílias com seus pets, além de se dedicar à produção de fotos para editoriais e publicidade no setor. Segundo ele, ainda existe muita gente que acredita erroneamente na ideia de que é necessário “cansar” o animal antes de uma sessão fotográfica para evitar que o bicho fique agitado. “Um pet cansado fica apático, preguiçoso, não presta atenção aos estímulos, só quer mesmo retomar a energia e descansar. Quando acalorados e cansados, eles tendem a abrir muito a boca e colocar muito a língua para fora, e isso não é legal para a foto, principalmente para os cães. É muito importante orientar os tutores a não usarem essa tática antes de um ensaio”, explica Duarte.
Também experiente em fotografia de pets, a ex-designer Fernanda Cerioni diz que, além de estudar sobre a parte mais técnica da fotografia, é fundamental se aperfeiçoar em relação ao comportamento dos animais, buscando informações em cursos com veterinários, groomers (espécie de cabeleireiros de cães) e profissionais do ramo. Para ela, saber como lidar com a personalidade de cada cão é algo indispensável: “É necessário respeitar a atitude de cada um e ‘jogar na onda deles’. Há animais mais tímidos, assim como mais medrosos e mais agitados”, informa.
segurança em estúdio
Fotos produzidas em estúdio proporcionam ambiente de luz controlada, possibilitando uso de fundos e cenários para dar mais destaque aos pets, além de ser mais tranquilo, sem rotas de fuga para os mascotes escaparem. Um ambiente climatizado pode oferecer grande vantagem por permitir que os animais não transpirem, deixando-os mais confortáveis. Mas, por outro lado, o animal pode se sentir meio desconfiado em um novo ambiente fechado, portanto, é necessário deixá-lo se acostumar com o ambiente, ou seja, no caso dos cachorros, aquela “cheirada” no ambiente é mais do que necessária para que ele faça o reconhecimento do estúdio, o que o deixa mais tranquilo, acredita Fernanda Cerioni. “O local deve ser seguro, tomando muito cuidado para que nada possa ser engolido pelo animal”, adverte ela.
Acostumado a produzir ensaios em estúdio, Lionel Falcon usa uma mesa como estratégia para limitar a área de circulação do bicho, além de ser uma boa maneira de manter o fotógrafo no mesmo nível do modelo. Ele alerta que a mesa utilizada deve ser bem firme, sem trepidar, pois isso pode transmitir insegurança ao pet. O mais indicado é uma mesa de tosa usada em centros de estética caninos. “A mesa também só deve ser usada para bichos de pequeno e médio portes, modelos maiores devem ser fotografados no chão”, ensina ele.
Outra dica importante é procurar usar fundos neutros e sem estampas para valorizar o mascote, pois fundos muito coloridos podem roubar a cena, informa Falcon. Em relação à iluminação, os especialistas no assunto não têm restrição de gêneros: flash ou luz contínua é uma decisão particular de cada um, mas é bom lembrar que quanto melhor o fotógrafo dominar o esquema de luz, mais fácil será para coordenar tudo ao mesmo tempo. Fernanda lembra que, para quem optar pelo uso de flashes, é importante perguntar ao tutor se o pet tem algum tipo de medo em relação a relâmpagos.
No estúdio, o fotógrafo deve deixar preparado um espaço reservado para água fresca e o tapete higiênico, sempre que possível. É primordial ainda ter um pequeno estoque de petiscos e também um acervo de recursos, como brinquedos que emitem algum tipo de barulho para chamar a atenção do bicho durante a sessão. “Antes da sessão em estúdio, indico ao tutor que dê um bom banho no mascote para deixá-lo relaxado e também arrumadinho para a foto. Uma tosa bem-feita é indispensável, principalmente para aparar os pelos à frente dos olhos, pois aqueles quatro ou cinco fios esquecidos podem esconder os olhos, e isso não ajuda a captar a expressão do animal, que está no olhar dele”, afirma Falcon.
A luz ao ar livre
Ensaio em locação externa permite composições criativas do pet com o cenário, proporciona diversos tons à imagem (que podem variar a cada ensaio) e cria uma forma interessante de o animal interagir com o ambiente, permitindo imagens espontâneas. A luz natural também é outra vantagem, pois o fotógrafo não precisa se preocupar com esquemas de luz, mas deve saber como tirar o melhor proveito dela.
Por outro lado, Johnny Duarte lembra que são necessários alguns cuidados para fotografar em parques, praças, canis e até no quintal da casa do cliente: “Prefira dias mais frescos, mas, se não for possível, a sessão de fotos deve ser realizada nos períodos mais amenos do dia, como o começo da manhã e o finalzinho da tarde. Quando o cão está muito acalorado, coloco ele no meu carro com o ar-condicionado ligado. Isso ajuda bastante em ensaios externos” explica.
No mercado desde a década de 1990 fotografando para plantel de canis (animais de alta genética para reprodução, competição e exposição), Bibbo Camargo é especialista em produção de imagens técnicas com cães de manejo, ou seja, treinados para obedecer a comandos e que não costumam ficar agitados quando colocados em ambientes diferentes do habitual. Independentemente do tipo de animal, ele recomenda sempre conhecer a locação previamente, mesmo que seja no mesmo dia, algumas horas antes do ensaio: “Na locação, demarque os locais onde quer fazer as imagens. Isso poupa seu trabalho, o do tutor e evita estressar o cão andando em busca de um local bom para fotografar”, ensina.
A recomendação dos especialistas é sempre procurar locações com terrenos mais planos, sem muito aclive ou declive para o animal. Selecionar um cenário atraente que contraste com a cor do pelo do animal também é importante. Um fator fundamental: em ambiente externo sem algum tipo de cerca de proteção, como parques e praças, é necessário tomar todos os cuidados: o cão nunca deve ficar solto, por mais obediente que ele seja. Acidentes podem acontecer e o cão na guia é a forma mais segura de fotografá-lo, mesmo que você tenha que tirar o acessório depois no Photoshop.
Para o curitibano Bibbo Camargo, o animal é muito sensível e percebe os sentimentos dos humanos. Por isso, ele credita que o estado de espírito do fotógrafo também é importante na hora de clicar. Se o fotógrafo ou tutor está ansioso, o bicho sente e não colabora. Portanto, paciência é fundamental nesse segmento. Petiscos e brinquedos, como bolinhas, não podem faltar, pois são fortes atrativos para despertar emoções durante os cliques.
Johnny Duarte lembra que filhotes com menos de três meses estão com a imunidade ainda em formação, portanto jamais devem ser retirados de áreas como a do canil ou da residência onde vivem para serem fotografados. “É um risco”, alerta.
Gatos, capítulo à parte
Com temperamento mais independente do que os cães, os gatos têm certas particularidades na hora de serem fotografados. Especialista no assunto, a fotógrafa e veterinária Silvia Pratta atua desde 2013 clicando felinos para editoriais de revistas especializadas, exposições e ensaios em família. Segundo ela, é importante contar com um ambiente calmo, sem muito barulho, de forma que o bichano possa ficar à vontade e sem estresse.
Além disso, é indispensável ter consciência de que os felinos têm um timing diferente do visto em cães, com o qual o fotógrafo deve se habituar e respeitar para fazer um trabalho de maneira segura e confortável. “Alguns recursos são importantes para chamar a atenção do gato, como brinquedos coloridos, acessórios sonoros e penas. São truques infalíveis”, explica a especialista. Ela trabalha com um estúdio móvel, desenvolvido exclusivamente para gatos, com o qual viaja para exposições nacionais e internacionais e, claro, que também leva na casa de clientes. Ela lembra que, independentemente do local onde for montar o estúdio, é imprescindível que seja seguro e não ofereça pontos de fuga para o gato.
O esquema de trabalho dela envolve uma mesa bastante segura para posicionar os bichanos, fundos coloridos e flashes da marca Alienbees, de 320 e 160 watts. Silvia Pratta afirma que a foto ideal de gato é a que valoriza o que cada raça tem de melhor. A raça maine coon, por exemplo, é de grande porte, considerada gigante, portanto, é necessário mostrar essa característica do felino por meio da luz e do ângulo. Já o persa tem pelagem exuberante, e isso, segundo a fotógrafa, precisa transparecer na foto, para valorizar o aspecto denso e fofo, que pode ser ressaltado com a cor do fundo, que deve contrastar com a do bichano.
A dica de Johnny Duarte é que o fotógrafo deve estar preparado para lidar com o fato de que gatos não são controláveis. “Eles fazem o que querem, na hora que querem, se quiserem. Um gato mais calmo, por exemplo, não vai se animar facilmente com qualquer estímulo”, comenta. É fundamental captar o olhar atento do gato, ensina ele, e para incentivá-lo ele sugere brinquedos que lembrem pássaros ou ratos. “Um laser point também costuma atrair a atenção dos gatos”, diz. O truque pode ser usado também com gatos mais ativos, com a vantagem de o tempo de colaboração do gato agitado ser maior, ensina. O essencial é evitar um olhar levemente caído, para Duarte, o erro mais grave em fotos de felinos.
O especialista lembra que um dos maiores problemas em ensaios com gatos é lidar com a inquietação que eles sentem quando estão fora de seu ambiente cotidiano. Eles não têm o costume de sair de casa e, por isso, ficam tensos. “O gato demora um tempo para se acostumar com o estúdio. O ideal é deixá-lo circular pela área antes de começar. Mas às vezes o bicho não se acostuma e nenhuma imagem fica legal. É muito ruim quando o fotógrafo está trabalhando para uma agência publicitária, por exemplo”, comenta Duarte.
Para evitar problemas assim, Johnny Duarte usa truques com frequência, caso do Feliway, dispositivo plugado à parede que libera feromônios no ambiente, deixando o gato mais calmo e amigável. Outra tática é colocar no cenário ou no colo do dono um pouco de “erva de gato”, planta que pode vir em forma de grama ou folhas secas que costuma provocar reações nos felinos, como agitação, euforia ou sensação de paz – mas para alguns não faz a menor diferença.
Independentemente do artifício, o especialista diz que gatos dão mais atenção ao ambiente em que estão do que fotógrafo. Assim, quanto maior o espaço, mais tempo ele demora para se ambientar – quando o gato é filhote, o trabalho tende a ser mais fácil, pois, como ele não está ambientado nem com a própria casa, o estúdio não provoca suspeita. “Um estúdio ideal para fotografar deve ser pequeno, sem ‘esconderijos’ em potencial, com poucos objetos e bem fechado. E não pode faltar caixa de areia para as necessidades do felino”, ensina. Uma plataforma elevada, de cerca de 1 metro, ajuda a delimitar o espaço de circulação do gato e fica mais confortável para o fotógrafo, que não precisa ficar em posições estranhas ao registar o animal.
Portfólio, primeiro passo
Quem pretende se inserir no mercado de fotografia de pets precisa ter em mente que um bom portfólio é o primeiro passo para conseguir conquistar clientes. Esse portfólio pode ser feito com a colaboração dos amigos, vizinhos, pet shops e até ONGs que precisam de imagens para ajudar na campanha de adoção de animais.
É durante a composição do portfólio especializado que o fotógrafo poderá praticar técnicas de luz, de composição e de domínio de truques com os animais, além de buscar informações sobre atendimento ao cliente e de como trabalhar em nichos de mercado. É fundamental também que o iniciante comece a criar um estilo que dê identidade ao trabalho.
A melhor vitrine atualmente para divulgar trabalhos, segundo os especialistas, são as redes sociais. Uma página comercial no Facebook e no Instagram permite ao profissional impulsionar publicações na sua região de atuação e garantir visibilidade em meio ao público interessado em fotografia de pets. Com o passar do tempo e a prática, o marketing boca a boca também será uma estratégia importante para essa área de negócio, ou seja, quem passou pela experiência de fazer o ensaio e gostou do trabalho e do atendimento poderá indicar o fotógrafo para outros clientes.
Em ensaios do mascote com o tutor ou com a família, o fotógrafo pode oferecer a linha de sessões com gestantes, crianças e até temáticos. É o caso de Fernanda Cerioni, que inseriu o smash the cake para pets, com direito a decoração e bolo especialmente desenvolvido para animais, além de sessões natalinas e juninas para as famílias que amam os bichinhos de estimação. Fernanda acredita que essa é uma maneira de gerar novos trabalhos ao longo do ano, fora os books tradicionais oferecidos para as famílias.