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12-2023

Morre Eliott Erwitt, mestre que uniu informação, humor e criatividade na fotografia

O renomado fotógrafo Elliott Erwitt, famoso por suas imagens divertidas de cães e seus donos, assim como por fotos memoráveis de políticos e celebridades, morreu aos 95 anos, anunciou a agência Magnum. “Ele faleceu tranquilamente em casa, cercado de sua família”, comunicou por meio da rede X  (ex-Twitter) a famosa agência fotográfica fundada em 1947. Segundo informações do jornal The New York Times, Erwitt morreu na quarta-feira à noite em sua casa em Manhattan, Nova York. “Suas imagens nos ajudaram a entender quem somos como sociedade e como seres humanos, e inspiraram gerações de fotógrafos, apesar das mudanças nas tendências e na indústria”, disse em nota a presidente da Magnum, Cristina de Middel.

Nova York, 1974: um dos fragrantes mais icônicos de cães e donos feitos pelo mestre Eliott Erwitt

Elliott Erwitt era conhecido por sua enorme capacidade de capturar momentos únicos, desde grandes instantes históricos, como o momento de tensão entre os líderes soviético e americano Nikita Khrushchev e Richard Nixon em 1959, até outros pouco convencionais como os flagrantes que colhia nas ruas de cães e seus tutores. “Ele acreditava firmemente que a fotografia deveria falar mais aos sentidos e às emoções do que ao intelecto”, destacou a agência Magnum. Paralelamente à sua carreira como fotógrafo, que o levou a captar imagens de Marilyn Monroe, Jackie Kennedy, do general francês De Gaulle e de Che Guevara, também dirigiu vários documentários para cinema/TV e publicou mais de 20 livros.

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O charme inconfundível da atriz Marilyn Monroe, fotografada por Eliott Erwitt em 1960

Elio Romano Ervitz nasceu em Paris, França, em 1928, filho de pais judeus russos, que tiveram que deixar o país após a revolução socialista – o nome “Romano” foi incluído porque seu pai estudou na Universidade de Roma. Elio viveu seus primeiros dez anos na Itália, para onde os pais se mudaram, mas o fascismo o levou para os Estados Unidos – a família se instalou definitivamente em Los Angeles, Califórnia, em 1941. Graças a essas mudanças familiares e “a Benito Mussolini”, dizia, ele se tornou o americano Elliott Erwitt, um dos mais importantes fotógrafos de todos os tempos.

Uma de suas imagens mais conhecidas: casal namorando no carro em praia da Califórnia, em 1955

Nessas idas e vindas, Erwitt aprendeu quatro línguas que, segundo ele, foram muito importantes na sua carreira como fotógrafo. A vida de imigrante também serviu para facilitar as andanças pelo mundo, reunindo um portfólio invejável, celebrado aonde quer que vá – inclusive no Brasil, onde esteve em maio de 2005 para dar um workshop em São Paulo (SP). Antes dessa visita ao Brasil, Erwitt lembrou que foi um dos primeiros fotógrafos internacionais a registar Brasília, com suas avenidas ainda de terra. A imagem está em alguns de seus livros e na edição de 1963 da “Photography Annual”, em página dupla – ele também fez imagens memoráveis no Rio de Janeiro (RJ).

O humor faz parte de muitos flagrantes capturados por Erwitt ao longo de uma carreira de seis décadas

Com bom humor reconhecido tanto em suas fotos quanto nele mesmo, era pai de seis filhos e avô do mesmo número de netos – estava no seu quarto casamento e, com mesma verve que lhe era peculiar, comentava assim sobre o fato de muitas de suas imagens serem engraçadas: “Nem todo mundo me acha engraçado! Pelo menos nenhuma das minhas ex-esposas me acha engraçado”.

Uma das imagens que fazem parte do livro “Whoof”, que só tem imagens de cães e seus donos

Pouca gente se dá conta, mas Eliott Erwitt também trabalhou com fotografia de publicidade, mas é necessário destacar que seu perfil “publicitário” nunca foi convencional. Muitos clientes eram governos de países cujas cidades ele registrou para divulgação do turismo, o que o aproxima do jornalismo novamente. Mesmo quando as imagens eram para campanhas, como a do uísque Chivas Regal, das luminárias Artemide ou dos carros Nissan, pareciam seus “snapshots”, com predominância de negativos em P&B. Na publicidade ainda houve espaço para seus flagrantes consagrados, como a da série de cachorros – extremamente humorística – que deu origem ao livro “Whoof” – o caráter onomatopaico do título tem sua razão: Erwitt costumava latir para os cães que fotografava com a intenção de provocá-los. “Cachorros são como pessoas, só que com mais pelos! Melhor: não são chatos”, comentava.

Uma dos flagrantes mais engraçados captados por Erwitt nas suas andanças por Nova York

Ainda rapaz, Eliott Erwitt deixou o sul da Califórnia, onde morava. Queria ser como Modigliani, o pintor italiano. Adorava suas pinturas e principalmente o charme da boemia em que o artista vivia. Deve sua carreira, em parte, ao lendário Edward Steichen (1879-1973), fotógrafo e curador do MoMA, que lhe arrumou o primeiro trabalho. Contudo, em 1951, quando servia o exército, encontrou o fotógrafo Robert Capa (1913-1954), que estava começando uma pequena agência, a Magnum. “Ele disse para eu procurá-lo em Paris, a qualquer hora”.

O livro “Whoof” também inclui algumas fotos posadas, como esta de uma família com seu cão da raça pug

Foi o que Erwitt fez na primeira oportunidade. Em 1953, tirou a farda e assinou contrato com a agência Magnum, da qual foi membro até morrer. “Eu era um freelancer por natureza. A ideia de trabalhar para uma empresa era horrenda”, lembrava. O sistema de cooperativa da Magnum era o que o atraia, assim como a muitos dos grandes nomes da fotografia, mas como René Burri (1933-2014), ele achava que para alguns fotógrafos o dinheiro fala mais alto. Não se adaptavam ao sistema, ou melhor, à “irmandade”, como às vezes preferia chamar a agência.

Retrato de Eliot Erwitt feito por Juan Esteves quando o mestre esteve no Brasil em 2005

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