11-2025
Exposição no IMS apresenta a obra fotográfica da grande cineasta francesa Ágnès Varda
Muito antes de ser um nome central da história do cinema, com filmes que marcaram gerações, a francesa Agnès Varda (1928-2019) foi fotógrafa, algo que continuou presente na sua trajetória mesmo quando ela consolidou-se como cineasta. Esse lado menos conhecido de sua obra artística poderá ser visto na exposição Fotografia Agnès Varda Cinema, prevista para ser aberta no dia 29 de novembro Instituto Moreira Salles (IMS) Paulista e que ficará em cartaz até 12 de abril de 2026.

A francesa fotografou uma jovem acrobata do Circo da Ponte do Céu, em 1957, na sua visita à China
A mostra, com entrada gratuita, reúne cerca de 200 fotos feitas por Varda, principalmente entre as décadas de 1950 e 1960. A coleção apresenta imagens realizadas em viagens, incluindo registros inéditos na China, em 1957; fotos em Cuba, no contexto pós-revolução; e nos Estados Unidos, onde a artista documentou o grupo político Panteras Negras. Há ainda fotos feitas em Paris, como as de uma produção teatral, segmento com o qual ela se envolveu. A exposição também exibe trechos de filmes da autora, enfatizando como o comprometimento social, o olhar afetuoso e o humor caracterizam a sua produção.

Agnès Varda com sua Leica em frente à Grande Ponte do Yangtzé, na cidade de Wuhan, na China, estava em construção em 1957
Entre 1948 e 1961, AgnèsVarda trabalhou como fotógrafa oficial no Festival de Avignon e com o Teatro Nacional Popular. A exposição aborda esse período inicial de sua carreira, com destaque para registros da peça Papa Bon Dieu, encenada em 1958 pela Compagnie d’Art Dramatique des Griots, conhecida como Griôs, primeira companhia de teatro negro em Paris – as fotos captam o elenco em ação, a composição das cenas e outros detalhes da produção teatral. Em 1954, a trajetória da artista na fotografia foi marcada por uma pequena exposição no pátio da casa onde morava, na Rua Daguerre, em Paris. As imagens incluem registros de paisagens, naturezas-mortas, além de objetos cotidianos, como batatas – elemento posteriormente muito presente em sua filmografia.

Cena da peça “Papa Bom Dieu” encenada em 1958 pela Compagnie des Griots, primeiro grupo negro de teatro de Paris
Contudo, a maior parte da exposição é dedicada às viagens de Varda: em suas andanças pelo mundo, ela acompanhou grandes mudanças da segunda metade do século 20 com um olhar atento ao contexto político, mas também às sutilezas e aos detalhes, com interesse especial pelas mulheres e crianças. Há imagens produzidas em 1956, no sul da França, principalmente em Marselha, cidade marcada pela presença de imigrantes árabes e africanos, e também em Portugal, onde retratou a comunidade pescadora de Nazaré.

Numa viagem a Portugal em 1956, Agnès Varda registrou pescadores recolhendo a rede em Nazaré
Nesse núcleo, um dos principais destaques é a série que a Varda produziu na China, em 1957, quando viajou ao país como parte de uma delegação francesa. Grande parte inéditas, sendo exibidas pela primeira vez ao público, as fotos foram feitas após a Revolução Maoísta e antes da Revolução Cultural. Por cerca de dois meses, ela percorreu cidades, portos, fábricas, templos e comunidades rurais, registrando cenas cotidianas, personagens comuns e as transformações em curso no país.

Na China maoísta, antes da Revolução Cultural, a francesa documentou pescadores às margens do Rio Yangtzé em 1957
A exposição também traz fotos registradas em Cuba, em 1962, onde a cineasta esteve a convite de Fidel Castro. Com uma Rolleiflex e uma Leica, ela fez imagens de colheitas de açúcar, cerimônias de santería, festas populares, além de retratos de figuras históricas, como a cineasta Sara Gómez e o próprio Fidel, fotografado casualmente em uma praia. Há ainda imagens coloridas, exibidas pela primeira vez ao público.

Casal dançando salsa na rua na Cuba de Fidel Castro, onde Agnès Varda esteve em 1963 à convite do governo cubano
Em suas incursões pelo mundo, a francesa também viveu entre 1967 e 1968 na Califórnia, nos EUA, com seu marido, o diretor Jacques Demy, que filmava em Hollywood. No novo país, encontrou um ambiente marcado pelos protestos contra a Guerra do Vietnã e pelos movimentos de resistência política e cultural, como dos negros pelos direitos civis e contra o racismo. Isso a levou a documentar em Oakland, em 1968, o julgamento de Huey Newton, cofundador do partido Panteras Negras. A mobilização em torno do processo judicial transformou-se em um encontro público de denúncia da violência policial e de afirmação política do movimento negro.

Kathleen Cleaver, porta-voz do Panteras Negras, em 1968 durante o julgamento de Huey Newton, cofundador do partido dos negros americanos
Coorganizada pelo IMS, o Institut pour la photographie des Hauts-de-France e o Ciné-Tamaris, a mostra é realizada no âmbito da Temporada França-Brasil 2025. A curadoria é assinada por Rosalie Varda, diretora do Ciné-Tamaris e filha da cineasta, e João Fernandes, diretor artístico do IMS. Como parte da programação, ao longo do período expositivo, o Cinema do IMS Paulista exibirá uma seleção de filmes de Varda. A sessão de abertura está prevista para o dia 30 de novembro às 15h, com os curtas Os Panteras Negras (1968), Saudações, cubanos! (1963) e A Ópera-Mouffe (1958), seguida de um bate-papo com Rosalie Varda.

Agnès Varda com suas câmeras de filmar e de fotografar em retrato de feito por Julia Fabris em 2012


