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05-2019

Mulheres dominam a fotografia de parto

Bebê que nasceu dentro da bolsa gestacional foi uma das fotografias premiadas da fotógrafa Daniela Justus

Bebê que nasceu dentro da bolsa gestacional foi uma das fotografias premiadas da fotógrafa Daniela Justus

Por Juliana Melguiso & Redação

O momento de dar à luz é uma das situações mais aguardadas na vida de algumas mulheres, e registrar essas cenas se torna ainda mais especial pela emoção do momento. Esse é o grande apelo da fotografia de parto, seja humanizado ou não, segmento que vem crescendo ano a ano no Brasil e no mundo. Se não muito tempo atrás cabia ao pai, quando autorizado, fazer uma ou outra foto do parto, hoje há várias profissionais dedicadas ao mercado com um olhar que mistura fotojornalismo e documentário. É uma área dominada por mulheres, como a carioca Daniela Justus, que já fotografou cerca de 170 partos durante a carreira.

Formada em Tecnologia da Informação com mestrado em Marketing e também em Administração, Daniela abandonou a antiga profissão e atua como fotógrafa há 12 anos. Começou na atividade por hobby e hoje é reconhecida internacionalmente pelo seu trabalho, tanto que foi a vencedora de dois prêmios no concurso anual da Associação Internacional de Fotógrafos Profissionais de Nascimento, nas categorias Nascimento e Detalhes do Nascimento. Ela afirma que ganhar os prêmios foi uma surpresa. “Encaminhei as fotos para o concurso no último dia e nunca imaginei que pudesse ganhar. Porém, ele se tornou algo muito especial, pois ajudou a dar reconhecimento para o que faço e também para esse público tão específico”, avalia a fotógrafa.

Para Daniela, que é mãe de dois filhos, fotografar o nascimento de uma criança é muito mais do que fazer uma simples sequência de fotos. É preciso entender a fundo o que é o parto e como é a maternidade. “Você tem que estudar e se informar como é um parto normal, um parto humanizado, pois há muitas diferenças. Também é necessário dar liberdade para a mulher decidir o que deve fazer, pois só ela tem controle sobre esse momento tão especial”, explica. A dica dada pela profissional é que nesse segmento é preciso estar no tempo da gestante, e não no do fotógrafo. “Um dos pontos principais desse tipo de fotografia é saber quando e como deve fotografar, pois esse momento é único da mãe, e não do fotógrafo”, ensina Daniela.

Acima, o carinho de irmão na segunda foto premiada da fotógrafa no concurso; abaixo, Daniela, que já clicou 170 partos

Acima, o carinho de irmão na segunda foto premiada da fotógrafa no concurso; abaixo, Daniela, que já clicou 170 partos

A humanização

O parto humanizado, explica Daniela, nada mais é do que nenhuma ou o mínimo de intervenção médica possível durante o nascimento do bebê. Cabe à mãe escolher qualquer ação no decorrer do parto a fim de deixá-la mais confortável. Para a fotógrafa paulistana Lela Beltrão, ter a oportunidade de registrar um nascimento é algo único. “Quem trabalha com um parto humanizado tem a oportunidade de ver o nascimento como ele é, ou seja, livre. É sobre a mulher ter autonomia do seu próprio corpo e também mostrar o quão forte ela pode ser”, explica Lela, que na semana da realização da reportagem deu à luz o segundo filho, Caetano, em parto humanizado feito na casa dela.

Segundo Lela, esse registro documental é voltado para o bebê como uma forma de contar a história dele por meio de imagens. Também tem a finalidade de usar a fotografia como um agente transformador da mulher. “Muitas mulheres têm receio do parto. Criar e mostrar essas imagens fazem com que a mulher possa fazer suas escolhas e que esse tipo de prática seja desmistificado”, avalia. Segundo dados divulgados pelo Ministério da Saúde em março de 2017, houve uma queda no número de cesarianas em hospitais. Lela acredita que o parto normal e o humanizado são benéficos para a mulher e o bebê, e que essa tendência crescerá, voltando a ser como antigamente, quando praticamente não havia cesarianas – só em casos de risco para a mãe e o bebê.

O primeiro contato de mãe e filho após o nascimento é extremamente importante

O primeiro contato de mãe e filho após o nascimento é extremamente importante (Foto: Lela Beltrão)

Fotógrafa há cerca de 20 anos, Lela iniciou a carreira no segmento de partos há apenas três, logo após o nascimento da primeira filha. Ela se especializou como doula (tipo de assistente de parto que não necessariamente possui formação médica, como as antigas parteiras), o que contribui ainda mais para fotografar e apoiar as mães durante o momento do parto. “No geral, não existem muitas restrições quanto a fotografar esses momentos. Mas é importante saber quais tipos de luz utilizar, onde não tocar e como não atrapalhar de jeito nenhum a concentração da mãe no momento do parto”, comenta.

A fotógrafa também foi premiada no concurso anual da Associação Internacional de Fotógrafos Profissionais de Nascimento com uma menção honrosa por uma imagem de um parto pélvico (em que o bebê pode nascer “sentado” durante parto normal). Para ela, a repercussão que a foto teve foi maior do que qualquer prêmio. “Foi um parto difícil por causa da posição do bebê, mas fotografar esse momento e compartilhá–lo nas redes sociais ajudou a mostrar para as mães, e até mesmo para quem não é, que isso é completamente normal”, conta Lela.

Já a curitibana Luciana Zenti, que clicou cerca de 50 partos, acredita que a área é muito específica. Um dos fatores essenciais para registrar essas cenas é deixar a mãe e toda a família em situação confortável para serem fotografadas. Assim como as outras profissionais, Luciana conta que uma conversa prévia com a família aproxima e cria uma relação entre fotógrafo e os clientes. “Esse tipo de trabalho é delicado e deve ter uma conexão com a família. Ela deve se identificar com o profissional e se sentir confortável com ele”, ensina.

O fotógrafo deve ter cuidado redobrado durante os partos realizados em hospitais (Foto: Luciana Zenti)

O fotógrafo deve ter cuidado redobrado durante os partos realizados em hospitais (Foto: Luciana Zenti)

A fotógrafa (que também é jornalista) diz que uma das maiores dificuldades na área é o tempo, que é imprevisível, pois se trabalha no ritmo da mãe e da criança. “Você não tem um horário fixo ao fotografar um partos, principalmente por ocorrerem em sua maioria durante a madrugada. Já fiquei horas acompanhando um parto e a criança demorar para nascer. Porém, já houve caso de chegar na maternidade e o bebê nascer em menos de dez minutos, ou seja, o tempo pode ser seu aliado ou seu adversário”, afirma Luciana, que chegou a passar cerca de 26 horas à espera de um parto.

Quanto à questão da iluminação, a recomendação é unânime: quanto menos luz durante o parto, melhor. O flash é quase proibido pela possibilidade de atrapalhar tanto a mãe como os médicos. Porém como fotografar durante momentos que a escuridão é quase total? A alternativa encontrada é a iluminação indireta, que oferece uma luz mais aconchegante. “Como esses ambientes podem se tornar muito escuros, a opção é utilizar pequenas fontes de iluminação indireta como abajures, velas, luminárias e até mesmo abrir uma porta que forneça claridade”, explica Luciana, que, como as colegas, também tem dois filhos.

Um exemplo de parto humanizado feito em casa

Um exemplo de parto humanizado feito em casa (Foto: Luciana Zenti)

Outra dica é utilizar sempre lentes luminosas e não ajustar um ISO muito alto para evitar granulação da imagem. A zoom 24-70 mm f/2.8, uma das mais versáteis, é considerada a ideal para o momento. Também é possível até arriscar o uso de macros para captação de detalhes do parto. Uma dúvida comum é se o equipamento deve ou não ser esterilizado durante o trabalho, seja em casa ou no hospital. As profissionais dizem que não é obrigatório, porém deve-se estar sempre atento em que lugar ficar e onde não tocar para não prejudicar a mãe ou o bebê.

Luciana, Daniela e Lela acreditam que quem pretende fotografar um momento tão específico como o parto deve se preparar muito bem, ter sempre muito respeito pelo tempo da mãe e de seu bebê e estar ciente de que é um momento que envolve muita emoção: nenhuma outra área da fotografia representa tão bem a vida como flagrar o surgimento dela.

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