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09-2016

Tele para que te quero

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Para fotografar com superteles na mão é preciso de muita prática; o mais comum é usar tripé ou monopé

Na construção da mitologia da teleobjetiva existem dois fatores: o visual imponente com um nada sutil toque fálico e as imagens impressionantes que ela gera na mão de um fotógrafo que sabe o que quer. Ela forma portfólios deslumbrantes de animais selvagens em plena corrida, nado ou voo. Ginastas flutuando magicamente pelo ar. Automóveis e motos esportivas executando ultrapassagens alucinantes. Tudo isso congelado em detalhes minuciosos, impossíveis de detectar a olho nu, com cores vibrantes e um enquadramento tão fechado e cheio que dá a impressão de que eles todos vão sair das fotos e passar zunindo na sua frente.

Mas, ironicamente, quanto mais longa a distância focal da objetiva, mais difícil é obter uma dessas imagens deslumbrantes. Em primeiro lugar, as exigências de precisão na construção da lente multiplicam-se, com os fabricantes fazendo mágicas para manter sob controle as distorções, aberrações e fantasmas.

Além disso, acertar o foco pode ser uma tarefa frustrante, pois a exigência de alta velocidade na captura obriga o fotógrafo a usar a lente totalmente aberta, gerando uma profundidade de campo muito reduzida. As chances de errar se multiplicam, mesmo contando com a velocidade furiosa dos sistemas de foco de múltiplos pontos que equipam as DSLRs mais modernas.

No quesito velocidade, quanto maior for a distância focal da objetiva, maior será sua suscetibilidade a vibrações. Um mero sopro de vento pode borrar irremediavelmente a foto – para não falar do movimento próprio do animal ou veículo que está sendo fotografado. Tripé e monopé são itens essenciais. As exposições precisam ser muito curtas: 1/1000 avos de segundo passa a ser um valor trivial. Nas exposições consideradas mais lentas, é preciso fotografar pacientemente com o espelho levantado (mirror lock).

E tem mais: uma captura radical em locação só funciona bem se houver luz suficiente para o fotógrafo poder trabalhar com exposições rigorosamente curtas sem colocar o ISO na estratosfera. Se houver luz abundante, existe a possibilidade de surgir o tremor atmosférico, aquela agitação do ar quente que deforma a aparência de tudo que estiver próximo à superfície em dias de calor, arruinando potencialmente a foto.

Mas o melhor de tudo: aquelas fotos de animais selvagens com closes extremamente fechados provavelmente foram cortadas, isso mesmo, cortadas a partir de quadros maiores, cheios de informação visual irrelevante. E não é apenas porque a lente do fotógrafo não tinha um campo de visão tão estreito quanto seria desejável. É que se torna quase impossível enquadrar com precisão objetos em movimento rápido, especialmente na parte da trajetória em que estão transversais à lente. Automóveis, aeronaves, aves e atletas tornam-se assuntos dificílimos para as lentes quando se movem lateralmente – que, ironicamente, é quando estão na melhor pose.

Portanto, a “telefotografia”, se é que é possível cunhar mais um termo técnico nessa altura da história, é um campo desafiador e recompensador para quem quiser se aventurar. No mercado de produtos fotográficos usados há uma quantidade muito mais vasta de teleobjetivas do que de grandes angulares. Tradicionalmente, a segunda objetiva de um iniciante com sua DSLR é uma normal (50 mm) ou uma tele, não uma grande angular. Essa lente é, sem dúvida, um objeto de desejo. Grande parte do elevado nível de sedução (e a correspondente frustração) proporcionado pelas teles pode estar ligada à relativa dificuldade de operação. Então, vai encarar?

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Fotos de vida selvagem exigem o uso de superteles profissionais

A descoberta de um outro mundo visual

Antes de ir fundo nas características funcionais das teles, é preciso levar em conta as características ópticas especiais que as distinguem dos outros tipos de objetivas. Em primeiro lugar, o ângulo de visão é estreito (inferior a 10 graus nas lentes maiores) e a distância mínima de foco é longa (tipicamente de alguns metros, sendo menos de meio metro na normal e apenas alguns centímetros na grande angular).

Considerando isso, as objetivas longas são empregadas para retratar temas distantes do fotógrafo. Mas isso não deve ser interpretado como se fosse dito que essas objetivas “aproximam” o tema. É melhor pensar nelas como sendo capazes de criar um visual peculiar e não como substitutas ao ato salutar e digno de colocar-se a uma distância mais adequada do tema.

É bom ter em mente que as imagens dos paparazzi de celebridades são feitas com teleobjetivas longas, usadas de forma furtiva para que os fotógrafos não sejam notados. Quem fotografa esportes e natureza certamente não busca esse tipo de impressão visual (mas ser furtivo é bom para não espantar os bichos).

O fato de o ângulo de visão da lente ser estreito e o tema estar distante faz com que a perspectiva da cena enquadrada pareça “achatada”. Os planos variam menos de escala em relação uns aos outros. Em outras palavras, os objetos à frente e atrás do tema não ficam tão, respectivamente, maiores ou menores como ficariam se fossem registrados com uma lente mais curta e a partir de uma distância menor. A perspectiva peculiar das teles tem vantagens ou desvantagens conforme se considere que ela não parece natural aos olhos, sempre acostumados a contemplar perspectivas mais amplas com objetos mais próximos.

Há fabricantes que preferem chamar suas objetivas longas de “telelentes”. Teleobjetiva é o nome específico de um design que contém elementos ópticos adicionais dedicados a encurtar o comprimento da lente em relação a sua distância focal. O reverso desse design, chamado retrofocal, é amplamente usado em grandes angulares para câmeras reflex, pois permite que elas sejam fisicamente mais longas que a sua distância focal, e dessa forma abrem espaço para o espelho móvel à frente do sensor.

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Em esportes, como o futebol, os fotógrafos profissionais trabalham com superteles

O que as melhores teleobjetivas têm

Se você pensa em acrescentar uma teleobjetiva ao seu equipamento, veja a seguir algumas características que são desejáveis. Nem todas estão presentes ao mesmo tempo num mesmo modelo, já que cada uma incorre num custo maior para o produto. Somente modelos profissionais bastante caros preenchem a maioria dos quesitos. Modelos para iniciantes não vêm com colar para tripé, trava de zoom, limitador de foco ou foco combinado AF+MF. Para várias dessas objetivas, o para-sol deve ser comprado separadamente. No entanto, a maioria delas traz estabilização e algumas até oferecem uma posição macro; são valiosas para estudar e treinar.

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Grupo de fotógrafos profissionais em ação com superteles em torneio de tênis

Estabilização óptica

Chamada pela Canon de IS e pela Nikon de VR, é um sistema dentro da objetiva que detecta vibrações e tremores e desloca parte dos elementos internos na direção contrária e com velocidade correspondente para anular o movimento. Sempre é um recurso útil, pois mesmo que não faça muito para melhorar a captação de temas em movimento rápido faz uma diferença considerável com temas estáticos. Pode representar a diferença entre ser obrigado a parar tudo e montar o tripé ou simplesmente clicar com a câmera firme na mão, sem receio de tremer a imagem. Para quem produz filmagem com a câmera, é um diferencial da maior importância, a não ser que se esteja disposto a cortar e estabilizar o vídeo na pós-produção, o que nem sempre é fácil ou rápido de ser feito.

As melhores fotos de pássaros são geralmente feitas com superteles

As melhores fotos de pássaros são geralmente feitas com superteles

Abertura máxima f/4 ou f/2.8

As teleobjetivas com zoom mais populares atualmente são os modelos de 70-200 mm, fabricados em duas versões: com abertura máxima f/4 ou f/2.8 em toda a sua extensão. A versão f/2.8 capta um ponto de diafragma a mais de luz (isto é, o dobro) que a f/4. Mas a f/2.8 custa quase o dobro do preço da f/4 e é bem maior, pesando bem mais (novamente o dobro). Para quem não tem nenhuma das duas, a versão 2.8 quase invariavelmente desperta mais desejo e cobiça graças a seu porte e aparência imponentes. Mas a f/4 também existe por boas razões, e até pode ser a escolha mais sensata para a maioria dos fotógrafos.

Durante a era do filme, a abertura f/2.8 era um dado padrão para essa categoria de lente em uso profissional. Entretanto, a tecnologia digital alterou esse estado de coisas. O que justifica que seja desejável uma abertura máxima maior em uma tele são três fatores: necessidade de fundos mais desfocados, tempos de exposição mais curtos e capacidade de trabalhar com menos luz. A era digital habilitou o uso de sensibilidades ISO extremamente elevadas nos sensores para obter resultados comparativamente satisfatórios em relação ao que se obtinha antes com os filmes. É preciso considerar que simplesmente não era trivial encontrar filmes coloridos mais rápidos que ISO 100 até a década de 1980 ou ISO 400 até a década de 1990. As câmeras SLR digitais produzidas na última meia década podem ir muitíssimo além ao se considerar o desempenho de ruído em função do ISO.

O ISO mais alto permite obter imagens ultrarrápidas sob luz fraca que antes simplesmente não seriam possíveis com filme. Dessa maneira, a diferença na aparência do desfoque do fundo entre as duas aberturas (considerando que o tema esteja a mesma distância da câmera) passa a ser o único fator que a lente f/4 simplesmente não consegue reproduzir da f/2.8. Ainda assim, a diferença é bem pouca para assuntos mais distantes, e certamente imperceptível para leigos. As dimensões e peso menores das lentes f/4 são vantajosas para quem precisa carregar o equipamento em sessões muito longas, como em viagens. A qualidade óptica não fica devendo às nada irmãs maiores e mais pesadas.

 


 

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Quanto mais distante o assunto, mais será necessário o uso de uma supertele

Foco automático com opção manual instantânea

As lentes para uso profissional permitem manter o autofoco permanentemente ativado e reajustar o foco com a mão a qualquer momento, sem ser necessário desligar o AF por meio de uma chavinha, como é o usual nas lentes mais básicas.

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Em fotos de vida selvagem o tripé é fundamental para a utilização da supertele

Controle de diafragma manual

O anel de abertura manual pode estar presente na base da lente. Mas no mundo digital ele é cada vez mais raro, já que há muito tempo as câmeras permitem o controle do diafragma por intermédio do corpo. Modelos clássicos de objetivas da Nikon e de terceiros, como Sigma e Zeiss, ainda oferecem esse ajuste manual (ele é totalmente ausente na linha Canon EF). Ao usar uma objetiva Nikkor com anel de abertura em uma câmera digital, ele deve ser fixado na abertura mínima; para isso existe uma pequena trava manual.

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Há cenas, como esta de uma competição aquática, que só dá para fazer com uma supertele

Colar e suporte para tripé

As teles longas contam com um suporte para tripés ou monopés – alguns são removíveis e outros integrados à lente. Os removíveis são fixados com abraçadeiras de pressão. A base do suporte tem rosca para tripé ou monopé, o que deixa a câmera suspensa. Com um monopé instalado, o conjunto formado com a lente e a câmera pode ser carregado de forma prática por cima do ombro, como se fosse uma enxada; essa é uma prática usual dos fotógrafos de esportes (dá para fazer isso também com o tripé fechado).

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Para sonhar: supertele Canon 600 mm f/4 que custa US$ 12.800 no exterior

Limitador de foco

As objetivas mais longas possuem elementos de vidro volumosos e pesados; o mecanismo de foco automático é mais lento por conta disso. Caso a lente perca o foco, poderá gastar um tempo precioso “caçando” o ponto focal, movimentando o mecanismo até a distância mais próxima e de volta a mais distante. Para amenizar o incômodo, diversos modelos de objetivas contam com uma chave que limita o foco a uma faixa de distâncias mais longas.

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Um pouco mais barata: Nikkor 500 mm f/4, que vale US$ 10.300

Trava de zoom

Algumas objetivas mais pesadas (incluindo diversas que são mais curtas, não apenas as teles) podem alongar o zoom sozinhas quando apontadas para baixo e encurtar quando apontadas para cima por conta da força da gravidade sobre o seu peso. Essa falha desagradável é apelidada de “zoom rastejante” (zoom creep). Algumas objetivas não têm remédio para o problema, enquanto algumas trazem uma trava de zoom. A maioria simplesmente tem um mecanismo de zoom propositalmente “duro”, requerendo um esforço razoável com a mão para mudar sua posição.

Para-sol

O para-sol é obrigatório se a intenção é evitar os “fantasmas” luminosos e a perda de contraste que resultam do espalhamento de luz oblíqua dentro da objetiva. Com a presença do sol ou outra fonte de luz pontual intensa dentro do quadro, não há como evitar completamente esses fenômenos ópticos. Mas, quando a fonte da luz está apenas ligeiramente fora do quadro, há muita variação na capacidade das objetivas de evitar a interferência dessa luz. Aí entra o para-sol: ele bloqueia a luz indesejada antes que entre na lente. Muitas objetivas têm uma baioneta à frente da lente para a colocação de um para-sol feito sob medida. Nesses modelos, o acessório pode ser instalado invertido para reduzir o volume total durante o transporte. Existem também lentes com um para-sol embutido deslizante, e algumas em que a peça é integrada.

 

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